20160802

Insondáveis são os desígnios do pop

O cantor catarinense Marco Audino tira o CD de uma caixa do bagageiro do carro. Antes de trocá-lo de mãos, ele conta que o show de lançamento será às 21h do próximo dia 11, no Teatro Álvaro de Carvalho (TAC), em Florianópolis. Só então entrega o disco, chamado Renova-me, acompanhado da ressalva:

– Não te contei, mas meu trabalho é gospel – informa, preparado para alguma eventual resistência.



Ei, devagar com o andor que o santo é de barro. De Tim Maia fase Racional a Rodolfo, que largou os Raimundos após encontrar Jesus; de Bob Marley e sua pregação rastafári a Cat Stevens, rebatizado Yusuf Islam ao virar muçulmano, a história do pop está cheia de artistas que fizeram da música um meio de professar a bem-aventurança que lhes invadia o coração. Marco está passando pelo mesmo processo. Com a diferença de que nenhum problema na cabeça, ziquizira ou mau olhado cercou sua conversão.

– Eu simplesmente fui a um churrasco com os irmãos da igreja e me identifiquei com a palavra, com o louvor. Me converti por amor – confessa.

A igreja em questão é a Sara Nossa Terra, que conheceu em 2003, levado pela futura esposa, quando ambos ainda moravam no Rio de Janeiro. O casal mudou-se para a Ilha em 2013 e Marco deu seguimento à sua arte, atuando e cantando. Até que a religião falou mais alto.

– Mas é para ser ouvido como um disco de pop – avisa.

Ex-vocalista do finado grupo Stryx, quarteto local que sentiu o cheiro do sucesso no final da década de 1980 com “Nu de Corpo e Alma”, ele nunca se despiu tanto como em Renova-me. Das 12 faixas, oito trazem Deus, Senhor ou fé no título. Tirando o discurso, é rock-pop feito com cacoete e capricho tipicamente oitentistas (“Senhor do Universo”, “Armas pra Viver”). É nessa pegada que o artista se fia para conquistar seu espaço. Mas o verdadeiro milagre será se conseguir ser ouvido por algum não fiel.

Sem escalas até os anos 80
O primeiro disco da banda Metrô, Olhar, vai ganhar uma reedição comemorativa de 30 anos. Dito assim, sem vaselina, parece que todo mundo sabe do que se trata. Um pouco do contexto: o grupo liderado pela mimosa Virginie Boataud abalou a parada brasileira na década de 1980 com hits adoçicados como “Beat Acelerado”, “Sândalo de Dândi”, “Tudo Pode Mudar” e “Johnny Love”. O atraso no lançamento (a efeméride se completou em 2015) é compensado pelas demos de 1984 e registros ao vivo que compõem o material. Vale lembrar que, no passado, a formação original se reuniu e soltou a inédita “Dando Voltas no Mundo” na internet. Não aconteceu nada, mas, conforme a receptividade que a estreia rediviva atingir, nada impede que o quinteto volte para valer.




 ANÇAMENTOS



Nice as Fuck, Nice as F*#k – Eis um caso de banda com pedigree e nome mais legal do que a música. O trio feminino americano tem bagagem (suas integrantes tem currículo na cena indie) e atende por uma alcunha feita para chocar. Pena que a som não está à altura, com apenas o rock primário de “Runaway” e “Door” funcionando e olhe lá.



Massive Attack, The Spoils – Em mais um espasmo, a instituição inglesa de trip hop desova duas músicas que só aumentam a expectativa quanto ao prometido disco completo. A faixa-título, cantada por Hope Sandoval, traz aqueles climões que ela imprimia no Mazzy Star. Na outra, “Come Near me”, desponta Ghostpoet e suas rimas das profundezas.



(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

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