20151110

O barato dos Boogarins

O New York Times cravou que o disco “é conduzido por guitarras nebulosas, riffs cíclicos e vocais murmurantes – mas com pitadas de grooves da bossa nova de Jobim”. O Guardian disse que o mesmo álbum “é uma coleção intrigante de músicas que muda constantemente de direção, de delicadas guitarras cintilantes e baladas contemplativas a riffs fortes e ritmos pós-bossa”. Quando dois jornalões estrangeiros se arreganham desse jeito para o trabalho de uma banda nacional, que canta em português um tipo de música dominado por anglófonos, o mínimo que a gente deve fazer é conhecer essa banda.

O alvo de tamanha empolgação da crítica internacional chama-se Boogarins, vem de Goiânia e está pirando a cabeça de gringos com seu segundo disco, Manual (Ou Guia para a Dissolução de Sonhos). O mais surpreendente é que o grupo conseguiu tudo isso sem apelar para a malemolência dos ritmos brasileiros e outros estereótipos do Brasil-pandeiro, e sim investindo na linguagem universal do psicodelismo. O nova-iorquino ou o londrino pode não entender o que significam versos como “a maior demonstração de propagação ao ser é o eco”, mas dispensa a tradução para curtir a paisagem sonora.



Apesar de pertencer à linhagem simbolizada por Pink Floyd e, mais recentemente, Tame Impala, o Boogarins se destaca por agregar o verde e amarelo às cores tradicionais da lisergia. “Avalanche”, “Mario de Andrade/Selvagem” e “6000 Dias (Ou Mantra dos 20 Anos)” condensam Mutantes, Tropicalismo, rock rural e Secos & Molhados em diferentes doses e intensidades, indo do bucólico ao claustrofóbico, do rural ao urbano em poucos minutos. O efeito “brisante” de “San Lourenzo”, “Cuerdo” e “Sei Lá” garantem que a viagem transcorra sem solavancos para aqueles ambientados com o disco anterior, Plantas que Curam (2013).



A trajetória do Boogarins é tão delirante quanto sua música. Dois moleques, Benke Ferraz e Dinho Almeida, amigos de escola, gravam algumas canções de forma caseira. Por obra e graça do destino, essas canções encantam um pessoal nos Estados Unidos e o disco sai por lá e é distribuído também na Europa. De repente os dois, que nem banda direito tinham, precisam montar uma para excursionar por outros países. Enquanto as duplas sertanejas de seu Estado contam milhões, o Boogarins carimba o passaporte. Cada um com seu sonho.

Viagem pesada
Na renascença psicodélica brasileira cabe também o Supercordas, grupo carioca que chega a bordo de Terceira Terra. Neste terceiro disco, as samambaias, animais rastejantes e anfíbios marcianos apresentados  em Seres Verdes ao Redor (2006) dão lugar a um cenário distópico, onde imperam corporações, concreto e máquinas. De qualquer maneira, é preciso respeitar uma banda que abre o disco com uma música batizada de “Fundação Roberto Marinho Blues & Co.”.



TEM QUE CONHECER ||||||| TOMMY GUERRERO
Antes de enveredar pela música, o californiano fez o nome no skate nos anos 1980. A paixão pela pranchinha sobre rodas passou a ser dividida com a carreira artística a partir de 1998, com o disco Loose Grooves & Bastard Blues. Mas são os dois seguintes – A Little Bit’ of Something (2000) e Soul Food Taqueria (2003) – que consolidam a pegada do cara: grooves latinos e hip hop como base, tudo na maciota para proporcionar o bem-estar. Ele está de volta com Perpetual, prontinho para embalar finais de tarde à beira-mar.



(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

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