20151027

Os primeiros a apertar o botão

Um dos grupos mais importantes, revolucionários e influentes da história da música pop é também um dos mais desconhecidos. Formado em 1970, o Kraftwerk sobreviveu para ver os padrões rítmicos que desenvolveu em estúdio servirem como base para a eletrônica e o rap. Mesmo assim, sua história permanece envolta em mistério – muito por conta dos próprios integrantes, avessos a qualquer tipo de publicidade que não a produzida por eles mesmos. O que torna ainda mais bem-vindo o lançamento de Kraftwerk Publikation, a biografia dos quatro rapazes de Düsseldorf.

O livro do jornalista inglês David Buckley mostra o choque causado por um bando de alemães que iam na contramão do desbunde e da visceralidade vigentes na época. Com um visual de gerentes de banco, nenhum instrumento convencional e exagerando nos estereótipos atribuídos à sua nacionalidade – metódicos, analíticos, solenes, precisos, impessoais –, eles foram acusados de representar o fim da música. Na verdade, estavam a reinventando, totalmente mecânica e, a princípio, sem nenhuma conexão com as correntes dominantes do pop britânico e americano. Era subversão em nível máximo para cabeças criadas no ambiente da contracultura.

O Kraftwerk nasceu em 1970, ligado à vanguarda. Em 1974, com a incorporação do sintetizador, o mundo começou a assimilar seu autoproclamado (não sem uma certa ironia) “folk industrial”: música calcada em tecnologia sobre rodovias, trens, computadores; a paisagem típica da região em que viviam. O impacto foi tremendo. De David Bowie à rapaziada negra do Bronx nova-iorquino, da juventude britânica que mergulharia no tecnopop a produtores em busca de novidades para as pistas de dança, todos vislumbraram ali o futuro pelo qual tanto procuravam.

Naquele ano, seu quarto disco, Autobahn, finalmente cruzou as fronteiras nacionais e chegou às paradas da Inglaterra e dos Estados Unidos. Vem daí a grande questão levantada pelo livro. Sem a colaboração do único remanescente original, Ralf Hütter, e do outro fundador, Florian Schneider, o autor agarra-se à versão dos fatos de três ex-integrantes. Segundo Eberhard Kranemann, da formação inicial (e um poço de ressentimento por esta ser desvalorizada pela crítica), e Wolfgang Flür e Karl Bartos, participantes da fase áurea do grupo, o maior responsável pela sonoridade do grupo foi o produtor Conny Plank.

Hütter e Schneider atribuíram a ele um papel apenas técnico, o de engenheiro de som. Relegado a uma nota de rodapé na trajetória da banda, Plank morreria em 1987. O episódio está longe de tirar o brilhantismo do Kraftwerk, expandido nos álbuns Radio-Activity (1975), Trans-Europe Express (1977), The Man-Machine (1978), Computer World (1981) e Electric Café (1986). Mas, ao expor uma suposta vilania de artistas desinteressados da fama e da celebridade, que se comportavam como robôs e preferiam fios e diodos a carne e osso, revela que, afinal, eram todos humanos, demasiado humanos.

Kraftwerk Kompilation
Como não há uma compilação oficial do Kraftwerk, ao final do livro o autor elaborou uma lista de músicas essenciais da banda:



(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

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