20150814

Amor inteligente contra ódio burro

Viagem por Angola e Cabo Verde para buscar suas origens pessoais e musicais na África lusófona e entender melhor o mundo que quer combater e pelo qual quer lutar. Discursos com o dedo em riste nos shows abordando racismo, injustiça, violência e falta de oportunidades. Clipe com cara de superprodução que mostra os empregados (negros) de uma família rica (branca) virando o jogo contra os patrões. Tudo levava a crer que Emicida apareceria com um disco raivoso, pesado, uma convocação ao confronto que atestaria o fracasso do diálogo tentado no trabalho anterior.



“Cês diz (sic) que nosso pau é grande, espera até ver nosso ódio”, vocifera o rapper em “Boa Esperança”, o primeiro sinal concreto do álbum Sobre Crianças, Quadris, Pesadelos e Lições de Casa. A música – batizada com o nome de um navio negreiro – ganhou o vídeo referido acima e deu a impressão de que ele havia se cansado da diplomacia com que construiu sua imagem. Mas a convocação para a revolta é só o lado mais barulhento (e potencialmente midiático) do disco. O Emicida modelo 2015 ainda acredita que se “o ódio burro é moda hoje em dia, eu vim pra ser o amor inteligente”, como samba em& “Salve Black”.

Essa postura conciliadora traduz-se nas parcerias e na sonoridade. “Baiana”, com Caetano Veloso, empresta tambores ancestrais para contar um romance. Em “Chapa”, a tristeza pelo amigo desaparecido é emoldurada pelas batuqueiras caboverdianas do Terreiro dos Órgãos. O continente africano também ecoa na leveza de “Mufete”, “Madagascar” e “Passarinhos” (com Vanessa da Mata). Acompanhada por versos que conscientizam e entretêm, a faceta pop periga ser mais eficiente para impedir que se repitam situações como a narrada por Emicida no Facebook: artista com turnês na Europa e coisa e tal, para o taxista paulistano que o discriminou ele era apenas um “pretinho”.

TEM QUE CONHECER ||||||| VIOLENT FEMMES
Depois de 15 anos congelado, o Violent Femmes ressuscitou com a inédita “Love Love Love”. É uma boa oportunidade para descobrir o que o trio americano de Milwaukee fez de melhor. O grupo estreou com um disco homônimo em que não só estabelecia algumas características de um gênero que, na falta de um nome melhor, ainda era tachado de folk punk, como exalava uma originalidade que ia além da pegada “caipira indie”. O álbum seria reconhecido na década seguinte como a obra-prima que sempre foi, com “To the Kill”, “Add it Up”, “Kiss Off” e “Gone Daddy Gone” encantando toda uma geração que prefere ser chamada de alt country.



(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

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