20120411

CAP 2 | A chegada ao novo mundo


Os Beatles estavam em algum ponto do Atlântico próximo ao litoral marroquino quando uma luz intensa cegou a tripulação.

— Aí vem o sol — Harrison franziu o olhar. — Tá tudo certo.

Não estava. Eram sinais do El Abuelito, fenômeno climático-sensorial que invertia o campo magnético terrestre. Assim, embora os controladores a bordo indicassem o Oriente, o navio mudou de rumo para o Oeste. Ao perceber que havia algo errado, o capitão refletiu. Também considerava seus passageiros uns aspirantes a hooligans ansiosos por desembarcarem em um país subdesenvolvido em busca de sentido para as suas desprezíveis existências. E ficou na dele.

Antes que a viagem se tornasse um saco, a Fortaleza de Santa Cruz de Anhatomirim cresceu no horizonte. Mais adiante, surgiu a Fortaleza de São José da Ponta Grossa.

— Impressionante! — impressionou-se McCartney.

— Estas são apenas as casas de praia dos rajás indianos. Os palácios e templos mais imponentes estão no interior — desdenhou Harrison, com autoridade.

Atracaram no estaleiro Arataca, sob a cabeceira insular da ponte Hercílio Luz (ao lado, um raro registro do momento em que pisaram em solo florianopolitano). Mais do que a paisagem, os ingleses estranharam o sotaque local. Aos seus ouvidos liverpudianos, parecia um rádio cheio de estática. Coube a Harrison mais uma vez elucidar a questão.

— O idioma foi o grande legado de Vasco de Gama, que aqui esteve em 1498. Tanto é que a dinastia que mandava na cidade chamava-se Samorim, que nada mais é do que uma deformação do português Samutiri, “o grande senhor do mar” — ensinou, como se estivesse lendo a Wikipédia.

Apesar de não dominarem a língua, os Beatles conseguiram se comunicar com razoável desenvoltura. Diversas expressões do dialeto nativo tinham uma sonoridade anglófona, como step on, mock riddle ou too dish. À base desse restrito vocabulário e muita mímica, eles tentavam explicar sua situação aos desocupados que os rodearam: eram músicos que esperavam voltar da Índia com a espinha ereta, a mente aberta e o coração tranquilo.

Mas a Florianópolis da década de 1960 não estava habituada a receber muitos visitantes, ainda por cima estrangeiros. A infraestrutura e os serviços engatinhavam. Ir à Lagoa da Conceição ou a Jurerê, entre outros points hoje badalados no mundo inteiro e região, exigia paciência e espírito de aventura. O tempo sobrava para os guias turísticos. Um deles entendeu que aqueles quatro jovens gringos eram amigos de Luiz Henrique Rosa fissurados por mar, garotas e diversão.

Levou-os para um rancho alugado no Norte da Ilha.

Um comentário:

Guarda Belo disse...

"Ir à Lagoa da Conceição ou a Jurerê, entre outros points hoje badalados no mundo inteiro e região, exigia paciência e espírito de aventura."
Exigia?